No dia da Independência, de broche da Bandeira Nacional na lapela, o presidente da República fez um pronunciamento à Nação no horário eleitoral do PT para desancar a oposição, defender sua candidata a presidente e confundir a opinião pública acerca das quebras de sigilo fiscal na Receita Federal.
Além de deformar os atributos do poder delegado pelas urnas, o presidente eleito para presidir a todos os brasileiros trabalha para um partido (o que é vedado pela Constituição) e se imiscui indevidamente nas investigações em andamento na Receita e na Polícia Federal.
Procurando dar uma feição oficial ao manifesto acusou seus adversários disso e daquilo, mas não contou o caso direito nem entrou em nenhum detalhe sobre o assunto que põe sob suspeita o governo, o PT e a campanha presidencial do partido.
Luiz Inácio da Silva não esclareceu coisa alguma sobre o que está acontecendo, só afirmou que "baixezas" são cometidas contra a candidata a presidente e, de maneira demagógica, estendeu a "ofensa" às mulheres de todo País.
Se a candidata não sabe - ou não pode - se defender, a maioria das mulheres sabe perfeitamente como fazer isso, embora muitas não disponham de instrumentos suficientes e nem todas obtenham êxito.
No caso, a defesa extensiva de sua excelência seria bem recebida não só por mulheres, mas também por homens. Todos os cidadãos que tiveram o sigilo violado na Receita gostariam de ser defendidos por Lula, mas até agora não mereceram atenção das autoridades, preocupadas com a única mulher que ao governo interessa: Dilma Rousseff.
Tirando ela, a necessidade de protegê-la e a ânsia de que o País inteiro "reconheça" que a eleição está decidida antes mesmo de a eleição acontecer, nada mais parece importar.
Ainda há quem se pergunte o que leva a imprensa de um modo geral a dar crédito à denúncia da oposição de que as quebras de sigilo fiscal descobertas até agora, no ABC paulista e no interior de Minas Gerais, teriam como alvo o candidato a presidente pelo PSDB.
Vários fatores: o histórico de conduta, o fato em si (petistas como agentes da violação, tucanos e parentes do candidato como objetos dos atos), o interesse, mas principalmente a atitude dos suspeitos, agora corroborada pela reação direta e pessoal do presidente Luiz Inácio da Silva.
As mentiras e mais recentemente a contundência deixam pouquíssima margem para dúvidas.
Se não sentisse um aroma de perigo no ar, Lula não se incomodaria com o caso. Por muito mais, a crise aérea de 2006/2007, o presidente da República demorou meses até se pronunciar.
Sendo verdade, como diz o ministro da Fazenda - com outras palavras, claro -, que a Receita Federal é uma peneira, natural seria que o governo demonstrasse um mínimo de preocupação com o fato.
Quanto à "coincidência" de na lista constar os nomes da filha de José Serra, do genro, do marido da prima, do ex-caixa de campanha, de um ministro do governo FH e do vice-presidente do partido do candidato da oposição, torna mais grave por força da eleição.
Insuspeito talvez não, mas mais republicano poderia ser considerado o gesto do presidente da República se no lugar de insultos ele dirigisse ao candidato escusas pelos transtornos causados pelo Estado.
Em seguida, anunciasse uma devassa em regra na Receita, mais especificamente na delegacia de Mauá e respectivas ramificações.
Refresco. A candidata Marina Silva provavelmente se considerasse vítima da Receita caso seu sigilo fiscal tivesse sido quebrado.
Portanto, quem teve a privacidade violada pelo Estado não se "faz" de vítima. Por definição "é" uma vítima, independentemente da filiação partidária.
Só para raciocinar: e se o sigilo fiscal violado fosse o de um dos filhos do presidente Lula? E se o caso acontecesse no governo do PSDB?
Presidente partido! por Dora Kramer para o Estadão
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